quarta-feira, dezembro 21, 2011

Boas Festas


A todos que (por engano certamente) aqui vierem atracar, a gerência deseja-lhes umas Boas Festas.

terça-feira, dezembro 06, 2011

domingo, dezembro 04, 2011

Os 3 Reis Magos

... Belchior  ofereceu mirra, Baltazar trouxe ouro ... e   Gaspar tudo levou

quarta-feira, novembro 30, 2011

Provado cientificamente

O café excessivamente quente, em copo plástico, reduz em 2/3 a potência sexual do homem:




Primeiro queima os dedos e depois a língua.

segunda-feira, novembro 21, 2011

lema da semana

"Sofremos muito com o pouco que nos falta e gozamos pouco o muito que temos."

William Shakespeare

domingo, novembro 13, 2011

Touché!!




Para mim, o futebol é simples: são 90 minutos nos quais podes dar ou levar pancada, podes ganhar ou perder, mas no final respeitas o adversário e vais com a tua família jantar para aproveitar a vida. As coisas ficam dentro de campo. É um código de honra (...) Se todos viessem para a imprensa contar o que se passa dentro de campo, os jornais traziam polémicas diariamente.»


Excelente!!!

A arte do rabisco

sábado, novembro 12, 2011

Notas soltas

O processo discute a justeza dos honorários que serão devidos ao advogado no âmbito do seu patrocínio, e aguarda há quase 2 anos o envio por parte da ordem dos advogados  do solicitado laudo.
Um dia destes veremos o Sr. Bastonário  a clamar pela incompetência dos outros.

sexta-feira, novembro 11, 2011

Cronistas

O único maluco do País conformado

por FERREIRA FERNANDES

Uma coisa que me irrita nos pobres - coisa antiga, já Maria Antonieta tinha dado por ela (não é bem verdade, mas não estou aqui para discutir a lenda) - é a falta de imaginação deles: se não têm pão, por que não comem brioches? Outra coisa, nos pobres: a imprevidência. Andam ó-tio-ó-tio por o Metro fechar mais cedo, mas lembrarem-se de trazer o automóvel para a Baixa, está quieto! Depois do trabalho os pobres podiam ir comer umas gambas ao Pinóquio, ouvir fado para Alfama e quando lhes desse na gana metiam-se no carro sem dependerem dos transportes públicos. Mas não, preferem protestar contra as medidas de austeridade do Governo. E por falar neste, ele também embarca no pessimismo geral: vai para seis meses que tomaram posse e não há um ministro que anuncie a mudança da frota automóvel. Com exemplos destes, todos se encolhem, até Joe Berardo, que não há meio de exigir: "Se querem a minha colecção, passem-me um cheque em branco." Ao que, numa bravata linda, um verdadeiro secretário de Estado da Cultura aparecia na televisão: "Toma!" e estendia o cheque. Era um Portugal assim que eu queria, afoito. Se é para a desgraça, vamos de cabeça. Mas na "manif" marcada para um dia destes, nenhum sindicato avança com o aumento de 10%. Nem a Guarda exige um aeroporto internacional e Mortágua uma Faculdade de Medicina. Tudo nas encolhas! Magnificamente maluco só mesmo Jardim, que dá férias à ilha porque toma posse. 


Ensaio sobre a cegueira

por Manuel António Pina

Na Madeira, o Carnaval é sempre que um homem quiser. E o homem, Jardim, quer que seja todos os dias. Assim, os cerca de 30 mil funcionários públicos madeirenses (mais de 10% da população total!) tiveram ontem direito a três horas de tolerância de ponto para assistir "pessoalmente ou através dos meios de comunicação social" à tomada de posse do querido líder.
O piedoso acto realizou-se às 17 horas na Assembleia Regional, mas a dispensa de serviço foi dada a partir das 14, imagina-se que para os funcionários entrarem em estágio de preparação para muitas e emocionantes horas de discursos e elogios mútuos.
Três é exactamente o número de horas de trabalho a mais que os "cubanos" do cont'nente terão que agora prestar gratuitamente todas as semanas em nome crise financeira do país, incluindo a grossa parte dela por que é responsável o Carnaval orçamental madeirense, onde abunda, não o em trabalho gratuito, mas a ociosidade remunerada: ainda há pouco tempo, em Agosto, Jardim tinha dado (isto é, demos todos nós) mais uma tolerância de ponto, com direito a "ponte", para os funcionários verem o Rali Vinho Madeira...
A "troika" descobriu na Grécia uma ilha turística onde há 700 falsos cegos que o Governo subsidiava anualmente com 6,4 milhões de euros. Em Portugal descobrirá um continente com 10 milhões de cegos que subsidiam anualmente, com muitos mais milhões de euros, o Governo turístico de uma ilha.


 

domingo, novembro 06, 2011

Livros

Adicionar legenda


Tinha-o visto numa entrevista na televisão pouco antes de ir de férias e logo ai me chamou a atenção,  achei-o uma personagem  interessante, com um apurado sentido  de humor, que  me deixou  curioso.
Descobri -o  então  através deste livro durante as férias.
Num estilo muito próprio levou-me por uma historia alucinante e  de abundante fantasia,  que muito me agradou de ler. Ao contrário de Saramago,  e apesar de usar o mesmo conceito,  foi mais difícil a percepção dos diálogos em consequência  da ausência  de maiúsculas.
Talvez por isso   o seu novo romance, desta vez em  formato de escrita convencional,  já está pedido para o sapatinho.

sexta-feira, novembro 04, 2011

Culpa dos Tribunais?

Vai na quarta insistência junto da segurança social, o pedido foi em 01 de Fevereiro, decorreram já cerca de 9 meses e os autos aguardam relatório para decisão de incumprimento de responsabilidade parentais. Na melhor das hipóteses, acreditando que o relatório chegará aos autos um ano após o pedido e com a tramitação subsequente, designadamente a marcação de conferência de pais, haverá decisão um ano e meio após a instauração do incidente.

domingo, agosto 28, 2011

Gustav Klimt

Gustav Klimt (1862-1918) foi um dos artistas mais inovadores e controvertidos do início do século XX . Sob a influência de movimentos vanguardistas europeus representados nas exposições anuais, o estilo maduro de Klimt combina a modelação de arte decorativa com simbolismo complexo e alegoria, muitas vezes com conteúdo nitidamente erótico.







segunda-feira, agosto 22, 2011

Prosas

De Miguel Torga li há uns 20 anos,  “os bichos”, e,  a esta distancia,   recordo um livro pequeno de capa branca,  que  li num ápice e que gostei.
Há uns 6/7 anos, li “novos contos da montanha”, do qual ficou a ideia de uma escrita simples,  de leitura  não muito exigente,  retratando vivências essencialmente rurais. E por aí me fiquei.
Não sendo eu um grande consumidor de poesia, que exige, em meu entender, uma profundidade de espírito a que raramente me predisponho, curiosamente, não obstante a minha aversão,  foi um poema que aqui neste blog esteve durante  uns tempos,  que me deu vontade de melhor descobrir o Torga. Vi nesse poema a tal simplicidade de vocabulário que não o empobrecendo facilita a sua interpretação.
Fui, pois, à procura da poesia do Torga. Nenhuma outra  encontrei (não  li muita, confesso)  que despertasse em mim a mesma sensação,  pelo que regressado à  sua prosa me encontro,  e desta vez com outra curiosidade,  digamos que … com um olho na história  outro no escritor.



O PASTOR GABRIEL

Nunca houve em toda a montanha pastor como o Gabriel.
- Merecias outras ovelhas, homem! Disse-lhe um dia o Prior, desanimado da anarquia dos seus paroquianos, quando viu o rebanho do rapaz atravessar a estrema dum centeio sem tirar uma dentada.
- Deus me livre! já me vejo maluco com estas...
Mentira. O padre tinha razão. Era uma pena ver tanta autoridade, tanta vocação, tanto jeito natural, ao serviço de animais. Nem se pode fazer ideia! O carneiro mais teimoso, mais lorpa, mais churro, chegava às mãos do Gabriel e mudava de condição. Só não ficava a falar.
- Que fazes tu ao gado, criatura? Parece que o enfeitiças!
- Nada. Dou-lhe monte, como a outra gente. Sorria. E lá continuava a educar os  malatos com gestos e palavras que ninguém sabia fazer nem dizer. Nunca batia numa rés. O castigo era um simples olhar reprovativo, um assobio impaciente, uma  interjeição mal humorada. Mas bastava. Ao fim de algum tempo, cada cabeça como que porfiava em não desagradar ao dono, em viver sintonizada com aquele governo sem cajado. E dava gosto ver a disciplina com que o rebanho deixava o redil e atravessava o povo.
- Não há dúvida! Nem o mestre na escola! Continuava a rir-se por dentro. Espantavam-se com pouco. Com a pequenina amostra do muito que estava por detrás...
Na verdade, toda aquela disciplina tinha um fim, e era muito mais apertada do que parecia. Como os pastos no verão escasseavam, só havia uma solução: aceivar os nabais de noite, pela calada. Ora, para Áfricas dessas, o Gabriel necessitava de gado mudo e lesto, cegamente obediente ao comando. Por isso, sem dizer porquê nem por que não, exigia sistematicamente dos patrões que vendessem os carneiros mancos ou rebeldes, e ninguém ouvia o balido de nenhum.
- O teu gado não berra?
- Pergunta-lhe. É o berras! Ou não se chamasse ele Gabriel e não capitaneasse um bando de salteadores.
No meio da escuridão, abria a porta do curral e punha-se a andar. O rebanho atrás, como um cão rafeiro. À entrada da melhor sementeira, parava, perscrutava os horizontes e arrombava o tapume. Depois, em silêncio, deixava entrar os famintos e esperava que cada boca se fartasse em silêncio.
Se por acaso ouvia vozes ou passos de gente que se aproximava, subia acima da parede, descalçava os socos, batia com um no outro e largava a fugir com quantas pernas tinha. Não era preciso mais: quando chegava ao redil, já o rebanho lá estava.
- Não, tu hás-de ter qualquer segredo, qualquer mistério... insinuava o Languna, a sondar.
- Palavra de honra que não. E realmente não tinha. A coisa vinha-lhe espontaneamente, duma maneira directa, rápida, infalível, de entender e de se fazer entender por todos os seres vivos. Via um coelho na cama, falava-lhe e punha-lhe a mão em cima. Acalmava um cão açulado a sorrir-lhe.
Mas esta comunhão instintiva com a natureza dos bichos não tentava o Gabriel alargá-la à natureza dos homens. Desses arredava-se discretamente, sem querer passar, nas relações com eles, do plano amorfo da neutralidade. Alugava o suor. Enjeitado, sem vintém, servia este e aquele. A indústria de Ferrede era comprar gado magro, engordá-lo e vendê-lo. Portanto, quem tinha dinheiro tinha o poder, e não valia a pena discutir. Que lhe interessava a ele perder tempo com palavreado ou mendigar intimidades que sabia impossíveis de antemão? O que os donos de cada rebanho queriam já o sabia: era que lho entoirisse de qualquer maneira.
Recebia, pois, o farnel pela manhã, e ala que se faz tarde. Cada qual para o que nasce.
No verão em que fez vinte e dois anos, não pôde, contudo, ficar indiferente a um apelo que, muito embora fosse de cordeira no cio, vinha duma criatura cristã, com quem, de resto, acabou por casar.
Foi assim: como a serra inteira ardia na fornalha do Agosto, certo dia, no pino do sol, resolveu assestar o gado na loja. Servia então o Silvano, o maior proprietário da terra. E enquanto o rebanho, sonolento, ruminava, estendeu-se também no catre, igualmente sonolento e a ruminar. Era a hora do jantar, e lá em cima os patrões comiam e bebiam à tripa-forra. Ele, coitado, teria uma malga de caldo no fim do banquete, e viva o velho!
Nisto, sente passos pela escada abaixo, abre-se a porta, e a filha da casa, bonitota, mas de pêlo na venta, que nunca dera conta que o olhasse como homem e nunca lhe consentira que a olhasse como mulher, aparece de cântara na mão, ao vinho.
Em silêncio e sem se mexer, deixou-a passar para a adega, que era ao fundo, numa loja contígua Mas apenas sentiu-a desandar a torneira da pipa e a espuma do tinto a ferver dentro do barro lhe fez cócegas na garganta, pediu humildemente:
- Minha ama, dê-me uma pinga! - Dou. Anda cá bebê-la... Ergueu-se num pronto, saltou por cima do gado, entrou no armazém, recebeu a pichorra, levou-a à boca e começou a consolar a alma. De repente, sem mais nem para quê, a moça, calada, dá-lhe um empurrão à vasilha com a ponta do dedo. De respiração afogada e ainda engasgado, a tossir, relanceou-a toda. Ao machio, a senhora morgada!
E nada mais simples: pousou a caneca e dobrou a rapariga sobre uma facha de palha.

sábado, agosto 20, 2011

viagens (19/08/2011)







o cavalo sem patas - Arcos de Valdevez



jardim radiante (o meu preferido no festival de jardins 2011 - Ponte de Lima)

quinta-feira, agosto 04, 2011

quinta-feira, julho 21, 2011

O ninho


Sei um ninho.
E o ninho tem um ovo.
E o ovo, redondinho,
Tem lá dentro um passarinho
Novo.

Mas escusam de me atentar:
Nem o tiro, nem o ensino.
Quero ser um bom menino
E guardar
Este segredo comigo.
E ter depois um amigo
Que faça o pino
A voar...

( Miguel Torga)

domingo, junho 19, 2011

meio ano depois....


... de ter começado, finalmente acabei  de ler este livro. 
A verdade é que outros interesses me foram desviando,  sendo que também o achei apenas mais um livro,  reconhecendo-lhe alguma substância no descrever de determinada época (pós-guerra), mas sem encontrar quer no estilo do escritor quer  na própria história algo que verdadeiramente me surpreendesse.





Frida Khalo









Frida Kahlo de Rivera (06 de julho de 1907 - 13 de julho de 1954) foi uma pintora mexicana, mais conhecida pelos seus auto-retratos.
A obra de Kahlo é lembrada pela sua "dor e paixão", e suas cores intensas e vibrantes.  Seu trabalho tem sido celebrado no México, como emblemático da tradição nacional e indígena, e por feministas pela sua representação intransigente da experiência feminina e da forma.
A Cultura mexicana e a tradição cultural ameríndia está em  destaque no seu trabalho, que por vezes tem sido caracterizada como a arte Naïf ou arte popular e, em alguns casos, "surrealista".
Kahlo sofreu problemas de saúde ao longo da vida, muitos dos quais resultaram de um acidente de viação ocorrido  na sua adolescência.  Estas questões são refletidas nas suas obras, mais da metade dos quais são auto-retratos de um tipo ou outro.
 Kahlo sugeriu: "Eu pinto-me porque estou muitas vezes sozinha e porque sou o assunto que conheço melhor". 

domingo, junho 12, 2011

Cerejas

Gosto tanto de cerejas, são inúmeras as bancas que as vendem, como é possível estar a  passar a época e eu só ter comido duas??? 

terça-feira, junho 07, 2011

B-green





Era uma vez um rapaz que achava que ia ganhar um prémio...
Valeu pela experiência

domingo, junho 05, 2011

Recordações - VIII

Uns anos atrás, uns bons anos atrás,  a seguir ao almoço e enquanto no café se faziam planos para a tarde, não perdia nunca esta série.
Tinha tudo que eu gostava,  garçonetes em mini saia, alemães idiotas,  velhos tarados,  e carradas  de um  humor  delicioso, era rir de principio ao fim

Pinturas




Lembrar que Portugal tem talento no dia da escolha da mediocridade.

quarta-feira, junho 01, 2011

ser criança



 Estarei hoje mais longe da criança que fui que da criança que voltarei a ser (se lá chegar).

sábado, maio 28, 2011

Serralves em festa


... o ano passado assistindo ao concerto da Big Band do Hot Club de Portugal.

quarta-feira, maio 18, 2011

Sinceridade

Amizade Sem Sinceridade



Acredita-se ter encontrado um meio de tornar a vida deliciosa através da bajulação. Um homem simples que apenas diz a verdade é visto como o perturbador do prazer público. Foge-se dele porque não agrada a ninguém; foge-se da verdade que ele enuncia, porque é amarga; foge-se da sinceridade que proclama porque apenas traz frutos selvagens; tem-se receio dela porque humilha, porque revolta o orgulho que é a mais estimada das paixões, porque é um pintor fiel que nos faz ver quão disformes somos.
Não admira que seja tão rara: em toda a parte (a sinceridade) é perseguida e proscrita. Coisa maravilhosa, ela encontra a custo um refúgio no seio da amizade.Sempre seduzidos pelo mesmo erro, só fazemos amigos para ter pessoas particularmente destinadas a nos agradarem: a nossa estima resume-se à sua complacência; o fim dos consentimentos acarreta o fim da amizade. E quais são esses consentimentos? O que é que mais nos agrada nos amigos? São os contínuos elogios que lhes cobramos como tributos.
A que se deve que já não haja verdadeira amizade entre os homens? Que esse nome não seja mais do que uma armadilha que empregam com vileza para seduzir? «É, diz um poeta (Ovídio), porque já não existe sinceridade.»
Com efeito, retirar a sinceridade da amizade é torná-la uma virtude teatral; é desfigurar essa rainha dos corações; é tornar quimérica a união das almas; é introduzir o artíficio no que há de mais santo e a perturbação no que há de mais livre.
Baron de Montesquieu, in "Elogio da Sinceridade"




fonte: o citador

domingo, maio 15, 2011

Maresias

Aproveitando o domingo para ler o que se escreveu por aí na blogosfera, tocou-me especialmente este texto... aliás, gosto muito de a ler, por essa razão a tenho ali ao lado.

Mikhail & Inessa Garmash



... e, gostando, pode-se ver mais aqui

domingo, maio 08, 2011

Marinha

Navegavam há meses e os marujos não tomavam banho nem trocavam de roupa. O que não era novidade na Marinha Mercante britânica, mas o navio fedia!
O Capitão chama o Imediato:
- Mr. Simpson, o navio fede, mande os homens trocarem de roupa!
Responde o Imediato:
- Aye, Aye, Sir, e parte para reunir os seus homens e diz:
- Sailors, o Capitão está se queixando do fedor a bordo e manda todos trocarem de roupa.
- David troque a camisa com John, John troque a sua com Peter, Peter troque a sua com Alfred, Alfred troque a sua com Jonathan … e assim prosseguiu.
Quando todos tinham feito as devidas trocas, volta ao Capitão e diz:
- Sir, todos já trocaram de roupa.
O Capitão, visivelmente aliviado, manda prosseguir a viagem.



(um comentário que me fez rir tirado ali do blogue blasfémias)

A massagem da loirinha

Acer Palmatum


Nesta altura do ano fica com um vermelho bonito o meu acer

quarta-feira, maio 04, 2011

frase do dia

Viver é desenhar sem borracha (Milor Fernandes)

Contos

D. MARIA DA PIEDADE era considerada em toda a vila como “uma senhora modelo”. O velho Nunes, diretor do correio, sempre que se falava nela, dizia, acariciando com autoridade os quatro pêlos da calva:

− A vila tinha quase orgulho na sua beleza delicada e tocante; era uma loura, de perfil fino, a pele ebúrnea, e os olhos escuros de um tom de violeta, a que as pestanas longas escureciam mais o brilho sombrio e doce. Morava ao fim da estrada, numa casa azul de três sacadas; e era, para a gente que às tardes ia fazer o giro até ao moinho, um encanto sempre novo vê-la por trás da vidraça, entre as cortinas de cassa, curvada sobre a sua costura, vestida de preto, recolhida e séria. Poucas vezes saía. O marido, mais velho que ela, era um inválido, sempre de cama, inutilizado por uma doença de espinha; havia anos que não descia à rua; avistavam-no às vezes também à janela murcho e trôpego, agarrado à bengala, encolhido na robe-de-chambre, com uma face macilenta, a barba desleixada e com um barretinho de seda enterrado melancolicamente até ao cachaço. Os filhos, duas rapariguitas e um rapaz, eram também doentes, crescendo pouco e com dificuldade, cheios de tumores nas orelhas, chorões e tristonhos. A casa, interiormente, parecia lúgubre. Andava -se nas pontas dos pés, porque o senhor, na excitação nervosa que lhe davam as insônias, irritava-se com o menor rumor; havia sobre as cômodas alguma garrafada da botica, alguma malga com papas de linhaça; as mesmas flores com que ela, no seu arranjo e no seu gosto de frescura, ornava as mesas, depressa murchavam naquele ar abafado de febre, nunca renovado por causa das correntes de ar; e era uma tristeza ver sempre algum dos pequenos ou de emplastro sobre a orelha, ou a um canto do canapé, embrulhado em cobertores com uma amarelidão de hospital.

Maria da Piedade vivia assim, desde os vinte anos. Mesmo em solteira, em casa dos pais, a sua existência fora triste. A mãe era uma criatura desagradável e azeda; o pai, que se empenhara pelas tavernas e pelas batotas, já velho, sempre bêbedo, os dias que aparecia em casa passava-os à lareira, num silêncio sombrio, cachimbando e escarrando para as cinzas. Todas as semanas desancava a mulher. E quando João Coutinho pediu Maria em casamento, apesar de doente já, ela aceitou, sem hesitação, quase com reconhecimento, para salvar o casebre da penhora, não ouvir mais os gritos da mãe, que a faziam tremer, rezar, em cima no seu quarto, onde a chuva entrava pelo telhado. Não amava o marido, decerto; e mesmo na vila tinha- se lamentado que aquele lindo rosto de Virgem Maria, aquela figura de fada, fosse pertencer ao Joãozinho Coutinho, que desde rapaz fora sempre entrevado. O Coutinho, por morte do pai, ficara rico; e ela, acostumada por fim àquele marido rabugento, que passava o dia arrastando- se sombriamente da sala para a alcova, ter-se-ia resignado, na sua natureza de enfermeira e de consoladora, se os filhos ao menos tivessem nascido sãos e robustos. Mas aquela família que lhe vinha com o sangue viciado, aquelas existências hesitantes, que depois pareciam apodrecer-lhe nas mãos, apesar dos seus cuidados inquietos, acabrunhavam-na. Às vezes só, picando a sua costura, corriam-lhe as lágrimas pela face: uma fadiga da vida invadia-a, como uma névoa que lhe escurecia a alma.

Mas se o marido de dentro chamava desesperado, ou um dos pequenos choramingava, lá limpava os olhos, lá aparecia com a sua bonita face tranquila, com alguma palavra consoladora, compondo a almofada a um, indo animar a outro, feliz em ser boa. Toda a sua ambição era ver o seu pequeno mundo bem tratado e bem acarinhado. Nunca tivera desde casada uma curiosidade, um desejo, um capricho: nada a interessava na terra senão as horas dos remédios e o sono dos seus doentes. Todo o esforço lhe era fácil quando era para os contentar: apesar de fraca, passeava horas trazendo ao colo o pequerrucho, que era o mais impertinente, com as feridas que faziam dos seus pobres beicinhos uma crosta escura: durante as insónias do marido não dormia também, sentada ao pé da cama, conversando, lendo-lhe as Vidas dos Santos, porque o pobre entrevado ia caindo em devoção. De manhã estava um pouco mais pálida, mas toda correta no seu vestido preto, fresca, com os bandós bem lustrosos, fazendo-se bonita para ir dar as sopas de leite aos pequerruchos. A sua única distração era à tarde sentar-se à janela com a sua costura, e a pequenada em roda aninhada no chão, brincando tristemente. A mesma paisagem que ela via da janela era tão monótona como a sua vida: embaixo a estrada, depois uma ondulação de campos, uma terra magra plantada aqui e além de oliveiras e, erguendo-se ao fundo, uma colina triste e nua, sem uma casa, uma árvore, um fumo de casal que pusesse naquela solidão de terreno pobre uma nota humana e viva.

Vendo-a assim tão resignada e tão sujeita, algumas senhoras da vila afirmavam que ela era beata; todavia ninguém a avistava na igreja, a não ser ao domingo, com o pequerrucho mais velho pela mão, todo pálido no seu vestido de veludo azul. Com efeito, a sua devoção limitava-se a esta missa todas as semanas. A sua casa ocupava-a muito para se deixar invadir pelas preocupações do Céu: naquele dever de boa mãe, cumprido com amor, encontrava uma satisfação suficiente à sua sensibilidade; não necessitava adorar santos ou enternecer-se com Jesus. Instintivamente mesmo pensava que toda a afeição excessiva dada ao Pai do Céu, todo o tempo gasto em se arrastar pelo confessionário ou junto do oratório, seria uma diminuição cruel do seu cuidado de enfermeira: a sua maneira de rezar era velar os filhos: e aquele pobre marido pregado numa cama, todo dependente dela, tendo-a só a ela, parecia-lhe ter mais direito ao seu fervor que o outro, pregado numa cruz, tendo para amar toda uma humanidade pronta. Além disso, nunca tivera estas sentimentalidades de alma triste que levam à devoção. O seu longo hábito de dirigir uma casa de doentes, de ser ela o centro, a força, o amparo daqueles inválidos, tornara-a terna, mas prática: e assim era ela que administrava agora a casa do marido, com um bom senso que a afeição dirigira, uma solicitude de mãe provida. Tais ocupações bastavam para entreter o seu dia: o marido, de resto, detestava visitas, o aspecto de caras saudáveis, as comiserações de cerimonia; e passavam-se meses sem que em casa de Maria da Piedade se ouvisse outra voz estranha à família, a não ser a do dr. Abílio - que a adorava, e que dizia dela com os olhos esgazeados:

− É uma fada! é uma fada!...

Foi por isso grande a excitação na casa, quando João Coutinho recebeu uma carta de seu primo Adrião, que lhe anunciava que em duas ou três semanas ia chegar à vila. Adrião era um homem célebre, e o marido da Maria da Piedade tinha naquele parente um orgulho enfático. Assinara mesmo um jornal de Lisboa, só para ver o seu nome nas locais e na crítica. Adrião era um romancista: e o seu último livro, Madalena, um estudo de mulher trabalhado a grande estilo, duma análise delicada e sutil, consagrara-o como um mestre. A sua fama, que chegara até à vila, num vago de legenda, apresentava-o como uma personalidade interessante, um herói de Lisboa, amado das fidalgas, impetuoso e brilhante, destinado a uma alta situação no Estado. Mas realmente na vila era sobretudo notável por ser primo do João Coutinho.

D. Maria da Piedade ficou aterrada com esta visita. Via já a sua casa em confusão com a presença do hóspede extraordinário. Depois a necessidade de fazer mais toilette, de alterar a hora do jantar, de conversar com um literato, e tantos outros esforços cruéis!... E a brusca invasão daquele mundano, com as suas malas, o fumo do seu charuto, a sua alegria de são, na paz triste do seu hospital, dava-lhe a impressão apavorada duma profanação. Foi por isso um alívio, quase um reconhecimento, quando Adrião chegou e muito simplesmente se instalou na antiga estalagem do tio André, à outra extremidade da vila. João Coutinho escandalizou-se: tinha já o quarto do hóspede preparado, com lençóis de rendas, uma colcha de damasco, pratas sobre a cômoda, e queria-o todo para si, o primo, o homem célebre, o grande autor... Adrião porém recusou:

− Eu tenho os meus hábitos, vocês têm os seus... Não nos contrariemos, hem?... o que faço é vir cá jantar. De resto, não estou mal no tio André... Vejo da janela um moinho e uma represa que são um quadrozinho delicioso... E ficamos amigos, não é verdade?

Maria da Piedade olhava-o assombrada: aquele herói, aquele fascinador por quem choravam mulheres, aquele poeta que os jornais glorificavam, era um sujeito extremamente simples, − muito menos complicado, menos espectaculoso que o filho do recebedor! Nem formoso era: e com o seu chapéu desabado sobre uma face cheia e barbuda, a quinzena de flanela caindo à larga num corpo robusto e pequeno, os seus sapatos enormes, parecia-lhe a ela um dos caçadores de aldeia que às vezes encontrava, quando de mês a mês ia visitar as fazendas do outro lado do rio. Além disso não fazia frases; e a primeira vez que veio jantar, falou

apenas, com grande bonomia, dos seus negócios. Viera por eles. Da fortuna do pai, a única terra que não estava devorada, ou abominàvelmente hipotecada, era a Curgossa, uma fazenda ao pé da vila, que andava além disso mal arrendada... o que ele desejava era vendê-la. Mas isso parecia-lhe a ele tão difícil como fazer a Ilíada!... E lamentava sinceramente ver o primo ali, inútil sobre uma cama, sem o poder ajudar nesses passos a dar com os proprietários da vila. Foi por isso, com grande alegria, que ouviu João Coutinho declarar-lhe que a mulher era uma administradora de primeira ordem, e hábil nestas questões como um antigo rábula!...

− Ela vai contigo ver a fazenda, fala com o Teles, e arranja-te isso tudo... E na questão de preço, deixa-a a ela!...

− Mas que superioridade, prima! - exclamou Adrião maravilhado. - Um anjo que entende de cifras! Pela primeira vez na sua existência Maria da Piedade corou com a palavra dum homem. De resto prontificou-se logo a ser a procuradora do primo...

No outro dia foram ver a fazenda. Como ficava perto, e era um dia de março fresco e claro, partiram a pé. Ao princípio, Acanhada por aquela companhia de um leão, a pobre senhora caminhava junto dele com o ar de um pássaro assustado: apesar de ele ser tão simples, havia na sua figura enérgica e musculosa, no timbre rico da sua voz, nos seus olhos, nos seus olhos pequenos e luzidios alguma coisa de forte, de dominante, que a enleava. Tinha-se-lhe prendido à orla do seu vestido um galho de silvado, e como ele se abaixara para o desprender delicadamente, o contato daquela mão branca e fina de artista na orla da sua saia incomodou-a singularmente. Apressava o passo para chegar bem depressa à fazenda, aviar o negócio com o Teles e voltar imediatamente a refugiar-se, como no seu elemento próprio, no ar abafado e triste do seu hospital. Mas a estrada estendia-se, branca e longa, sob o sol tépido - e a conversa de Adrião foi-a lentamente acostumando à sua presença.Ele parecia desolado daquela tristeza da casa. Deu-lhe alguns bons conselhos: o que os pequenos necessitavam era ar, sol, uma outra vida diversa daquele abafamento de alcova...

Ela também assim o julgava: mas quê! o pobre João, sempre que se lhe falava de ir passar algum tempo à quinta, afligia-se terrivelmente: tinha horror aos grandes ares e aos grandes horizontes: a natureza forte fazia-o quase desmaiar; tornara-se um ser artificial, encafuado entre os cortinados da cama...

Ele então lamentou-a. decerto poderia haver alguma satisfação num dever tão santamente cumprido...

Mas, enfim, ela devia ter momentos em que desejasse alguma outra coisa além daquelas quatro paredes, impregnadas do bafo de doença...
− Que hei-de eu desejar mais? - disse ela.

Adrião calou-se: pareceu-lhe absurdo supor que ela desejasse, realmente, o Chiado ou o Teatro da Trindade... No que ele pensava era noutros apetites, nas ambições do coração insatisfeito... Mas isto pareceu-lhe tão delicado, tão grave de dizer àquela criatura virginal e séria - que falou da paisagem...
− Já viu o moinho? - perguntou-lhe ela.

− Tenho vontade de o ver, se mo quiser ir mostrar, prima. − Hoje é tarde.

Combinaram logo ir visitar esse recanto de verdura, que era o idílio da vila.
Na fazenda, a longa conversa com o Teles criou uma aproximação maior entre Adrião e Maria da Piedade. Aquela venda que ela discutia com uma astúcia de aldeã punha entre eles como que um interesse comum. Ela falou- lhe já com menos reserva quando voltaram. Havia nas maneiras dele, dum respeito tocante, uma atração que a seu pesar a levava a revelar-se, a dar-lhe a sua confiança: nunca falara tanto a ninguém: a ninguém jamais deixara ver tanto da melancolia oculta que errava constantemente na sua alma. De resto as suas queixas eram sobre a mesma dor - a tristeza do seu interior, as doenças, tantos cuidados graves... E vinha-lhe por ele uma simpatia, como um indefinido desejo de o ter sempre presente, desde que ele se tornava assim depositário das suas tristezas.

Adrião voltou para o seu quarto, na estalagem do André, impressionado, interessado por aquela criatura tão triste e tão doce. Ela destacava sobre o mundo de mulheres que até ali conhecera, como um perfil suave de ano gótico entre fisionomias da mesa redonda. Tudo nela concordava deliciosamente: o ouro do cabelo, a doçura da voz, a modéstia na melancolia, a linha casta, fazendo um ser delicado e tocante, a que mesmo o seu pequenino espírito burguês, certo fundo rústico de aldeã e uma leve vulgaridade de hábitos davam um encanto: era um anjo que vivia há muito tempo numa vilota grosseira e estava por muitos lados preso às trivialidades do sítio: mas bastaria um sopro para o fazer remontar ao céu natural, aos cimos puros da sentimentalidade...

Achava absurdo e infame fazer a corte à prima... Mas involuntàriamente pensava no delicioso prazer de fazer bater aquele coração que não estava deformado pelo espartilho, e de pôr enfim os seus lábios numa face onde não houvesse pós de arroz... E o que o tentava sobretudo era pensar que poderia percorrer toda aprovíncia em Portugal, sem encontrar nem aquela linha de corpo, nem aquela virgindade tocante de alma adormecida... Era uma ocasião que não voltava.

O passeio ao moinho foi encantador. Era um recanto de natureza, digno de Corot, sobretudo à hora do meio -dia em que eles lá foram, com a frescura da verdura, a sombra recolhida das grandes árvores, e toda a sorte de murmúrios de água corrente, fugindo, reluzindo entre os musgos e as pedras, levando e espalhando no ar o frio da folhagem, da relva, por onde corriam cantando. O moinho era dum alto pitoresco, com a sua velha edificação de pedra secular, a sua roda enorme, quase podre, coberta de ervas, imóvel sobre a gelada limpidez da água escura. Adrião achou-o digno duma cena de romance, ou, melhor, da morada duma fada. Maria da Piedade não dizia nada, achando extraordinária aquela admiração pelo moinho abandonado do tio Costa. Como ela vinha um pouco cansada, sentaram-se numa escada desconjuntada de pedra, que mergulhava na água da represa os últimos degraus: e ali ficaram um momento calados, no encanto daquela frescura murmurosa, ouvindo as aves piarem nas ramas. Adrião via-a de perfil, um pouco curvada, esburacando com a ponteira do guarda-sol as ervas bravas que invadiam os degraus: era deliciosa assim, tão branca, tão loura, duma linha tão pura, sobre o fundo azul do ar: o seu chapéu era de mau gosto, o seu mantelete antiquado, mas ele achava nisso mesmo uma ingenuidade picante. O silêncio dos campos em redor isolava- os - e, insensivelmente, ele começou a falar-lhe baixo. Era ainda a mesma compaixão pela melancolia da sua existência naquela triste vila, pelo seu destino de enfermeira... Ela escutava-o de olhos baixos, pasmada de se achar ali tão só com aquele homem tão robusto, toda receosa e achando um sabor delicioso ao seu receio...
Houve um momento em que ele falou do encanto de ficar ali para sempre na vila.

− Ficar aqui? Para quê? - perguntou ela, sorrindo.

− Para quê? para isto, para estar sempre ao pé de si...

Ela cobriu-se de um rubor, o guarda-solinho escapou-lhe das mãos. Adrião receou tê-la ofendido, e acrescentou logo rindo:

− Pois não era delicioso?... Eu podia alugar este moinho, fazer-me moleiro... A prima havia de me dar a sua freguesia...

Isto fê-la rir; era mais linda quando ria: tudo brilhava nela, os dentes, a pele, a cor do cabelo. Ele continuou gracejando, com o seu plano de se fazer moleiro, e de ir pela estrada tocando o burro, carregado de sacas de farinha.
− E eu venho ajudá-lo, primo! - disse ela, animada pelo seu próprio riso, pela alegria daquele homem a seu lado.
− Vem? - exclamou ele. - Juro-lhe que me faço moleiro! Que paraíso, nós aqui ambos no moinho, ganhando alegremente a nossa vida, e ouvindo cantar esses melros!

Ela corou outra vez do fervor da sua voz, e recuou como se ele fosse já arrebatá-la para o moinho. Mas Adrião agora, inflamado àquela ideia, pintava-lhe na sua palavra colorida toda uma vida romanesca, de uma felicidade idílica, naquele esconderijo de verdura: de manhã, a pé cedo, para o trabalho; depois o jantar na relva à beira da água; e à noite as boas palestras ali sentados, à claridade das estrelas ou sob a sombra cálida dos céus negros de verão...

E de repente, sem que ela resistisse, prendeu- a nos braços, e beijou-a sobre os lábios, dum só beijo profundo e interminável. Ela tinha ficado contra o seu peito, branca, como morta: e duas lágrimas corriam-lhe ao comprido da face. Era assim tão dolorosa e fraca, que ele soltou-a; ela ergueu-se, apanhou o guarda-solinho e ficou diante dele, com o beicinho a tremer, murmurando:

− É malfeito... É malfeito...

Ele mesmo estava tão perturbado - que a deixou descer para o caminho: e daí a um momento, seguiam ambos calados para a vila. Foi só na estalagem que ele pensou:
− Fui um tolo!

Mas no fundo estava contente da sua generosidade. À noite foi à casa dela: encontrou-a com o pequerrucho no colo, lavando-lhe em água de malva as feridas que ele tinha na perna. E então, pareceu-lhe odioso distrair aquela mulher dos seus doentes. De resto um momento como aquele no moinho não voltaria. Seria absurdo ficar ali, naquele canto odioso da província, desmoralizando, a frio, uma boa mãe... A venda da fazenda estava concluída. Por isso, no dia seguinte, apareceu de tarde, a dizer-lhe adeus: partia à noitinha na diligência: encontrou-a na sala, à janela costumada, com a pequenada doente aninhada contra as suas saias...

Ouviu que ele partia, sem lhe mudar a cor, sem lhe arfar o peito. Mas Adrião achou-lhe a palma da mão tão fria como um mármore: e quando ele saiu, Maria da Piedade ficou voltada para a janela escondendo a face dos pequenos, olhando abstractamente a paisagem que escurecia, com as lágrimas, quatro a quatro, caindo-lhe na costura...

Amava-o. Desde os primeiros dias, a sua figura resoluta e forte, os seus olhos luzidios, toda a

virilidade da sua pessoa, se lhe tinham apossado da imaginação. O que a encantava nele não era o seu talento, nem a sua celebridade em Lisboa, nem as mulheres que o tinham amado: isso para ela aparecia-lhe vago e pouco compreensível: o que a fascinava era aquela seriedade, aquele ar honesto e são, aquela robustez de vida, aquela voz tão grave e tão rica; e antevia, para além da sua existência ligada a um inválido, outras existências possíveis, em que se não vê sempre diante dos olhos uma face fraca e moribunda, em que as noites se não passam a esperar as horas dos remédios. Era como uma rajada de ar impregnado de todas as forças vivas da natureza que atravessava, sùbitamente, a sua alcova abafada: e ela respirava-a deliciosamente...

Depois, tinha ouvido aquelas conversas em que ele se mostrava tão bom, tão sério, tão delicado: e à força do seu corpo, que admirava, juntava-se agora um coração terno, duma ternura varonil e forte, para a cativar...
Esse amor latente invadiu-a, apoderou-se dela uma noite que lhe apareceu esta idéia, esta visão: − Se ele fosse meu marido! Toda ela estremeceu, apertou desesperadamente os braços contra o peito, como confundindo-se com a sua imagem evocada, prendendo-se a ela, refugiando-se na sua força... Depois ele deu-lhe aquele beijo no moinho.

E partira!

Então começou para Maria da Piedade uma existência de abandonada. Tudo de repente em volta dela - a doença do marido, achaques dos filhos, tristezas do seu dia, a sua costura - lhe pareceu lúgubre. Os seus deveres, agora que não punha neles toda a sua alma, eram-lhe pesados como fardos injustos. A sua vida representava-se-lhe como desgraça excepcional: não se revoltava ainda: mas tinha desses abatimentos, dessas súbitas fadigas de todo o seu ser, em que caía sobre a cadeira, com os braços pendentes, murmurando:

− Quando se acabará isto?

Refugiava -se então naquele amor como uma compensação deliciosa. Julgando-o todo puro, todo de alma, deixava- se penetrar dele e da sua lenta influência. Adrião tornara-se, na sua imaginação, como um ser de proporções extraordinárias, tudo o que é forte, e que é belo, e que dá razão à vida. Não quis que nada do que era dele ou vinha dele lhe fosse alheio. Leu todos os seus livros, sobretudo aquela Madalena que também amara, e morrera dum abandono. Essas leituras calmavam-na, davam-lhe como uma vaga satisfação ao desejo. Chorando as dores das heroínas de romance, parecia sentir alívio às suas.

Lentamente, essa necessidade de encher a imaginação desses lances de amor, de dramas infelizes, apoderou-se dela. Foi durante meses um devorar constante de romances. Ia-se assim criando no seu espírito um mundo artificial e idealizado. A realidade tornava-se-lhe odiosa, sobretudo sob aquele aspecto da sua casa, onde encontrava sempre agarrado às saias um ser enfermo. Vieram as primeiras revoltas. Tornou-se impaciente e áspera. Não suportava ser arrancada aos episódios sentimentais do seu livro, para ir ajudar a voltar o marido e sentir-lhe o hálito mau. Veio-lhe o nojo das garrafadas, dos emplastros, das feridas dos pequenos a lavar. Começou a ler versos. Passava horas só, num mutismo, à janela, tendo sob o seu olhar de virgem loura toda a rebelião duma apaixonada. Acreditava nos amantes que escalam os balcões, entre o canto dos rouxinóis: e queria ser amada assim, possuída num mistério de noite romântica...

O seu amor desprendeu-se pouco a pouco da imagem de Adrião e alargou- se, estendeu-se a um ser vago que era feito de tudo o que a encantara nos heróis de novela; era um ente meio príncipe e meio facínora, que tinha, sobretudo, a força. Porque era isto que admirava, que queria, por que ansiava nas noites cálidas em que não podia dormir - dois braços fortes como aço, que a apertassem num abraço mortal, dois lábios de fogo que, num beijo, lhe chupassem a alma. Estava uma histérica.

Às vezes, ao pé do leito do marido, vendo diante de si aquele corpo de tísico, numa imobilidade de entrevado, vinha-lhe um ódio torpe, um desejo de lhe apressar a morte...

E no meio desta excitação mórbida do temperamento irritado, eram fraquezas súbitas, sustos de ave que pousa, um grito ao ouvir bater uma porta, uma palidez de desmaio se havia na sala flores muito cheirosas... À noite abafava; abria a janela; mas o cálido ar, o bafo morno da terra aquecida do sol, enchiam-na dum desejo intenso, duma ânsia voluptuosa, cortada de crises de choro.
A Santa tornava-se Vénus.

E o romanticismo mórbido tinha penetrado naquele ser, e desmoralizara-o tão profundamente, que chegou ao momento em que bastaria que um homem lhe tocasse, para ela lhe cair nos braços: − e foi o que sucedeu enfim, com o primeiro que a namorou, daí a dois anos. Era o praticante da botica.
Por causa dele escandalizou toda a vila. E agora, deixa a casa numa desordem, os filhos sujos e ramelosos, em farrapos, sem comer até altas horas, o marido a gemer abandonado na sua alcova, toda a trapagem dos emplastros por cima das cadeiras, tudo num desamparo torpe - para andar atrás do homem, um maganão odioso e sebento, de cara balofa e gordalhufa, luneta preta com grossa fita passada atrás da orelha e bonezinho de seda posto à catita. Vem de noite às entrevistas de chinelo de ourelo: cheira a suor: e pede-lhe dinheiro emprestado para sustentar uma Joana, criatura obesa, a quem chamam na vila a bola de unto.

O Moinho (Eça de Queirós)

sábado, abril 30, 2011

Sublinhados - VI

(...) -Vestem a rainha e o rei camisas compridas, que pelo chão arrastam, a do rei somente a fímbria bordada, a da rainha bom meio palmo mais, para que nem a ponta dos pés se veja, o dedo grande ou os outros, das impudicícias conhecidas talvez seja esta a mais ousada. D. João V conduz D. Maria Ana ao leito, leva-a pela mão como no baile o cavaleiro à dama, e antes de subirem os degrauzinhos, cada um de seu lado, ajoelham-se e dizem as orações acautelantes necessárias, para que não morram no momento do acto carnal, sem confissão, para que desta nova tentativa venha a resultar fruto, e sobre este ponto tem D. João V razões dobradas para esperar, confiança em Deus e no seu próprio vigor, por isso está dobrando a fé com que ao mesmo Deus impetra sucessão. Quanto a D. Maria Ana, é de crer que esteja rogando os mesmos favores, se porventura não tem motivos particulares que os dispensem e sejam segredo do confessionário. Já se deitaram. Esta é a cama que veio da Holanda quando a rainha veio da Áustria, mandada fazer de propósito pelo rei, a cama, a quem custou setenta e cinco mil cruzados, que em Portugal não há artífices de tanto primor, e, se os houvesse, sem dúvida ganhariam menos. A desprevenido olhar nem se sabe se é de madeira o magnífico móvel, coberto como está pela armação preciosa, tecida e bordada de florões e relevos de ouro, isto não falando do dossel que poderia servir para cobrir o papa. Quando a cama aqui foi posta e armada ainda não havia percevejos nela, tão nova era, mas depois, com o uso, o calor dos corpos, as migrações no interior do palácio, ou da cidade para dentro, donde este bichedo vem é que não se sabe, e sendo tão rica de matéria e adorno não se lhe pode aproximar um trapo a arder para queimar o enxame, não há mais remédio, ainda não o sendo, que pagar a Santo Aleixo cinquenta réis por ano, a ver se livra a rainha e a nós todos da praga e da coceira. Em noites que vem el-rei, os percevejos começam a atormentar mais tarde por via da agitação dos colchões, são bichos que gostam de sossego e gente adormecida. Lá na cama do rei estão outros à espera do seu quinhão de sangue, que não acham nem pior nem melhor que o restante da cidade, azul ou natural. D. Maria Ana estende ao rei a mãozinha suada e fria, que mesmo tendo aquecido debaixo do cobertor logo arrefece ao ar gélido do quarto, e el-rei, que já cumpriu o seu dever, e tudo espera do convencimento e criativo esforço com que o cumpriu, beija-lha como a rainha e futura mãe, se não presumiu demasiado frei António de S. José. É D. Maria Ana quem puxa o cordão da sineta, entram de um lado os camaristas do rei, do outro as damas, pairam cheiros diversos na atmosfera pesada, um deles que facilmente identificam, que sem o que a isto cheira não são possíveis milagres como o que desta vez se espera, porque a outra, e tão falada, incorpórea fecundação, foi uma vez sem exemplo, só para que se ficasse a saber que Deus, quando quer, não precisa de homens, embora não possa dispensar-se de mulheres. (...)


Memorial do Convento

(José Saramago)

quinta-feira, abril 28, 2011

quinta-feira, abril 21, 2011

terça-feira, abril 19, 2011

Músicas

Acho curtida esta musica, e viciante, quanto mais a ouço mais vontade tenho de a voltar a ouvir

segunda-feira, abril 18, 2011

exercitando os musculos e a escrita

Acabadinho de chegar do parque - 6,6km em 30 minutos, desta vez favorecido por um sol que a cada passo se encondia e uma brisa fresca, dou por mim a pensar, e se fizesse isto com maior assiduidade?
Encontrei um destes dias por lá o Cabo Machado, com menos 19 quilos - bem visíveis na indumentária tamanho XL num corpo agora L - e admirei-o pela força de vontade, corre todos os dias, e, disse ele, foi isso e um pouco de cuidado na alimentação que o trouxe ao peso actual.
No meu caso, não tenho nem nunca tive problemas de peso, mas gosto do sabor mesclado de vitória cansaço e suor de cada vez chegado a casa descalço os ténis e me espraio debaixo do chuveiro. Afinal, reconheça-se, vencer a preguiça e a inércia nem sempre é fácil.

segunda-feira, abril 11, 2011

sexta-feira, abril 08, 2011

A Beatnicks

O ritual começava na estação da CP, sim, que na altura ter carro era privilégio para muito poucos. Eram quase sempre os mesmos a entrar no comboio das 3 e vinte, para uma curta viagem de não mais que 15 minutos.


Chegados à pequena aldeia era vê-los então em grupos, no trajecto até à pequena discoteca que os acolhia quase todos os domingos. Tinha a particularidade de não exigir pares na entrada sem que isso prejudicasse o equilíbrio necessário para não estragar o ambiente. Embora parecendo apenas um pequeno pormenor, isso acabou por fidelizar aqueles com pouco à vontade no momento do “não te importas que entre contigo?”, não contando com o risco de, não havendo a quem o fazer, passarem grande parte da tarde ali à porta ou merecerem a compaixão do porteiro, o Eusébio, rapaz sóbrio e de bigode sempre impecavelmente tosquiado.


Sentados em pufs ao redor da pista, e enquanto aguardavam que o DJ Chico abrisse as hostilidades trocavam-se olhares e observava-se quem ia chegando num jogo próprio, e que se repetia a cada domingo.


Mas o momento mais ansiado esse chegava a meio da matiné quando, subitamente, as luzes se reduziam e se ouviam as primeiras batidas das baladas. Era o momento dos slows, e aí começava a debandada da pista, regressando aos poucos, primeiro os pares já assumidos, depois os mais decididos no convite, e aos poucos, aqueles que por timidez ou por terem perdido as primeiras escolhas, ou que simplesmente tiveram maior dificuldade na “negociação do par”.


Mas aquele era também o momento em que outros carpiam em frente a um copo de cerveja ou uma cuba livre mais uma oportunidade perdida, com o olhar distraído nas sombras que se moviam na promiscuidade da bola de cristal, e onde de quando em vez o contraste do néon fazia brilhar o branco daqueles bustos.



(isto a propósito desta musica que passou à pouco na rádio)

quinta-feira, abril 07, 2011

Sublinhados - V

(... De certeza que a mulher ajoelhada se chama Maria, pois de antemão sabíamos que todas quantas aqui vieram juntar-se usam esse nome, apenas uma delas, por ser ademais Madalena, se distingue onomasticamente das outras, ora, qualquer observador, se conhecedor bastante dos factos elementares da vida, jurará, à primeira vista, que a mencionada Madalena é esta precisamente, porquanto só uma pessoa como ela, de dissoluto passado, teria ousado apresentar-se, na hora trágica, com um decote tão aberto, e um corpete de tal maneira justo que lhe faz subir e altear a redondez dos seios, razão por que, inevitavelmente, está atraindo e retendo a mirada sôfrega dos homens que passam, com grave dano das almas, assim arrastadas à perdição pelo infame corpo. É, porém, de compungida tristeza a expressão do seu rosto, e o abandono do corpo não exprime senão a dor de uma alma, é certo que escondida por carnes tentadoras, mas que é nosso dever ter em conta, falamos da alma, claro está, esta mulher poderia até estar inteiramente nua, se em tal preparo tivessem escolhido representá-la, que ainda assim haveríamos de demonstrar-lhe respeito e homenagem...)


Evangelho Segundo Jesus Cristo (José Saramago)

sábado, abril 02, 2011

Objectos


A minha "Puch" , companheira de muitos passeios há cerca de 20 anos

quinta-feira, março 31, 2011

Anda tudo a pé






Um pai tinha 3 filhos.

O mais velho pediu:

-Oh pai, queria 1 carro! Na faculdade só eu não tenho!

-Só quando eu pagar o tractor.

Vem o outro:

-Oh pai quero uma moto!

-Só quando eu pagar o tractor.

A seguir vem o mais novo.

-Pai quero uma bicicleta!

-Só quando eu pagar o tractor.

O miúdo vai pró quintal amuado, vê o galo em cima da galinha, dá-lhe um pontapé e diz:

-Nesta casa, enquanto o pai não pagar o tractor, anda tudo a pé!!!

quarta-feira, março 30, 2011

terça-feira, março 29, 2011

eis como eu me sinto

Fadiga






Nomes alternativos:

exaustão, letargia, cansaço, desgaste

Definição:

Sensação de falta de energia, desgaste ou cansaço.

Considerações gerais:

A fadiga não é o mesmo que sonolência, porém o desejo de dormir pode acompanhar a fadiga. A apatia é uma sensação de indiferença, e pode acompanhar a fadiga mas também pode ocorrer independentemente.

A fadiga representa uma reação normal e importante ao esforço físico, ao estresse emocional ou à falta de sono.

A fadiga também pode ser um sintoma não específico de um distúrbio psicológico ou fisiológico. A fadiga patológica (relacionada com doença) não pode ser aliviada com o repouso adequado, o sono adequado, a supressão dos fatores de estresse. A fadiga que não pode ser aliviada por meios normais, ou que ocorre na ausência de causas conhecidas, ou de outros sintomas, deve ser avaliada clinicamente.

O padrão de fadiga pode ajudar a delinear sua causa subjacente. As pessoas que se levantam de manhã descansadas, mas que com a atividade se cansam rapidamente podem estar com um problema ou uma doença em curso. As que acordam já cansadas e que o nível de fadiga permanece constante durante o decorrer do dia, pode estar sofrendo de depressão. No entanto, esses não são fatores absolutos e a fadiga crônica deve ser avaliada por um médico.

Em muitos casos, a fadiga está relacionada ao aborrecimento, infelicidade, decepção, falta de sono, ou trabalho intenso. Pela fadiga ser uma reclamação comum e muitas vezes ser causada por problemas psicológicos, sua gravidade potencial muitas vezes é negligenciada.